O diferencial de alíquotas (DIFAL) é devido em operações interestaduais realizadas com destinação a consumidor final contribuinte ou não do ICMS, conforme disciplina o art. 155, §2º, incisos VII e VIII da CF/88 [1], com alteração dada pela Emenda Constitucional n.º 87/2015.
Nesse contexto, em 2015 foi celebrado o Convênio ICMS n.º 93/2015, onde restou consignado que, nas operações interestaduais com não contribuintes, o cálculo do DIFAL deveria considerar a mesma base de cálculo utilizada para o recolhimento do ICMS devido na operação interestadual, apurada nos termos do art. 13, §1º da LC 87/96.
Ante o referido Convênio, o Estado do Rio Grande do Sul publicou a Instrução Normativa RE nº 039/16, a fim de regulamentar o cálculo do DIFAL, alterando, contudo, a sistemática de cálculo do diferencial para as operações que envolvam mercadoria destinada a contribuintes do ICMS.
A Instrução Normativa RE n.º 039/16 determina que o cálculo do DIFAL devido ao Estado do RS na entrada de mercadoria destinada a consumidor final contribuinte, utilize a alíquota interna para a formação da sua base de cálculo, em vez da alíquota interestadual que é utilizada na operação em concreto, considerando-se a seguinte fórmula de cálculo:
Portanto, o Estado do Rio Grande do Sul criou uma nova fórmula para calcular o diferencial de alíquota, a qual desconsidera a base de cálculo aplicada na operação interestadual, utilizando a alíquota interna, criando sistemática em que o diferencial de alíquota passa a ser calculado “por dentro”.
Dessa forma, com a inovação dada pela Instrução Normativa RE n.º 039/16, o contribuinte se vê diante de duas bases de cálculo diferentes para a mesma operação interestadual: uma base de cálculo para a alíquota interestadual, consignada na nota fiscal e outra base de cálculo para o DIFAL, que não corresponde àquela indicada na nota fiscal da operação, eis que o cálculo é feito de forma fictícia.
Trata-se, portanto, de uma base de cálculo simulada e distinta daquela utilizada na operação interestadual, a qual carece de amparo legal. E, por essa razão, necessário ponderar quanto à validade desta regra.
Com efeito, esta inovação na base de cálculo do DIFAL estabelecida pelo Estado do Rio Grande do Sul abre espaço para a discussão sob a perspectiva legal e constitucional. Primeiramente, tem-se que a competência para se dispor acerca da base de cálculo do tributo é de Lei Complementar, de acordo com o disposto nos arts. 146, III, ‘a’ e 155, §2º, XII, ‘i’, ambos da CF/88 [2]. Logo, a alteração da base de cálculo do tributo em tela não poderia ter sido feita por meio de instrução normativa, quando a Lei Complementar n.º 87/96 (Lei Kandir) é que regulamenta o ICMS.
Nesse viés, analisando-se a Lei Kandir, denota-se que, na verdade, não há qualquer amparo para que seja incluído na base de cálculo do DIFAL alíquota distinta daquela que compôs a base de cálculo na nota fiscal da operação interestadual. Isso porque, a referida lei não prevê para o DIFAL o cálculo “por dentro”, tampouco autoriza que se utilizem bases de cálculo distintas para uma única operação interestadual. Ora, o art. 13, §1º [3], da LC n.º 87/96, nada menciona quanto ao cálculo do diferencial de alíquota.
De igual maneira, a Constituição Federal de 1988, ao tratar do diferencial de alíquota em seu art. 155, §2º, VII e VIII, em momento algum dispôs sobre a possibilidade de se instituir sistemática de cálculo com utilização de alíquota distinta daquela verdadeiramente aplicada na operação interestadual para a determinação da base imponível.
Assim, não havendo qualquer regra legal ou constitucional autorizadora, a conclusão que se chega é que não poderia o Estado estabelecer uma nova base de cálculo para o DIFAL devido nas operações destinadas a contribuintes do ICMS, por meio da aplicação da alíquota interna (diversa daquela utilizada na base de cálculo constante na Nota Fiscal da operação).
Ainda que assim não fosse, tendo em vista esse sistema de cálculo do DIFAL implica, no fim das contas, em aumento do tributo, tal alteração deveria ser feita mediante lei (sentido estrito), conforme determina o art. 150, I, da CF.[4]
Nessa linha, a jurisprudência do E. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul vem se posicionando no sentido de que não há qualquer autorização legal para a sistemática de cálculo do DIFAL instituída pela IN RE 036/2016 e, portanto, essa viola os princípios da legalidade, bem como da anterioridade anual e nonagesimal.[5]
Diante disso, verifica-se a possibilidade de o contribuinte discutir a validade do cálculo do DIFAL instituído pela IN RE n.º 039/2016 no Judiciário, ante a relevância da matéria e fundamentos legais.
O Escritório Pimentel & Rohenkohl Advogados Associados se coloca à disposição para esclarecimentos acerca da matéria.
Caroline Schwalm Wölfle
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[1] Art. 155. (…) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
VII – nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual;
VIII – a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída:
[2] Art. 146. Cabe à lei complementar: (…)
III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
Art. 155. (…)
XII – cabe à lei complementar:
[3] Art. 13. (…) § 1º Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo:
I – o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle;
II – o valor correspondente a:
[4] Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
[5] Vide acórdãos dos processos 70075380154; 70076472919; 70080713472.