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17/11/2023

Limites da coisa julgada: data de início da tese e cobrança de multa

17/11/2023

Como informado pela newsletter da P&R Advogados (para inscrever-se nela, clique aqui), foi incluído na pauta do STF desta semana o julgamento dos recursos de embargos de declaração apresentados pelos contribuintes nos Temas 881 e 885, em que foi definida nova tese sobre os limites da coisa julgada em matéria tributária.

O julgamento dos recursos teve início na data de ontem, 16/11, e foi suspenso por pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Em fevereiro deste ano, ao julgar os referidos Temas, a Corte firmou a tese de que qualquer decisão proferida pelo STF declarando a constitucionalidade na cobrança de um determinado tributo faz cessar automaticamente o direito dos contribuintes de deixar de pagar as competências vincendas deste tributo, quando este direito havia sido reconhecido em um processo judicial já encerrado (com “trânsito em julgado”), em que fora declarada a inconstitucionalidade da cobrança. Para um aprofundamento sobre esta tese, sugere-se a leitura de artigo publicado anteriormente (clique aqui).

No âmbito jurídico, diz-se que os processos com trânsito em julgado formam a “coisa julgada”, que é a impossibilidade de rediscussão da causa. Trata-se de uma garantia com proteção constitucional e enquadrada como cláusula pétrea. O meio até então utilizado para afastar a coisa julgada quando ela contrariasse uma decisão do STF era uma ação própria, a ação rescisória, que possui o prazo de 2 anos para ser ajuizada. Com esta nova tese, a ação rescisória não se faz mais necessária: a partir da decisão do STF que declarar que o tributo é devido, o contribuinte deve passar a recolhê-lo, sem poder mais fazer uso da decisão transitada em julgado que lhe assegurava o direito ao não recolhimento. Por esta razão se tem dito que, com a nova tese firmada nos Temas 881 e 885, o STF está impondo novos limites ou mesmo flexibilizando a coisa julgada.

A questão que ainda permanece possível de discussão no STF, sobre estes limites da coisa julgada, é a data de início da nova tese. Isto é, a partir de quando o novo entendimento passou a valer: se apenas a partir de fevereiro de 2023, quando os Temas 881 e 885 foram julgados, ou se cobranças já realizadas pelo Fisco anteriormente, sem que tivesse havido o ajuizamento de ação rescisória, são válidas. A possibilidade da tese passar a valer apenas a partir de fevereiro é o que se chama de “modulação de efeitos”. Quando do julgamento da tese em fevereiro, o STF não aplicou a modulação de efeitos, pelo placar de 6×5.

Com os embargos de declaração dos contribuintes, a modulação de efeitos está sedo rediscutida. O julgamento destes recursos havia iniciado anteriormente em ambiente virtual, com o relator, ministro Barroso, desprovendo-os (negando a modulação de efeitos), no que foi acompanhado pela ministra Rosa Weber, antes de sua aposentadoria. A pedido do ministro Luiz Fux, os recursos foram levado a julgamento presencial.

Na sessão de ontem, acompanharam o relator os ministros Zanin, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e André Mendonça. Assim, formou-se uma maioria provisória de 7 votos para considerar válidas cobranças do Fisco, anteriores a fevereiro de 2023, em que não tenha havido o uso da ação rescisória para afastar a coisa julgada.

O ministro André Mendonça, em que pese tenha negado a modulação de efeitos, votou para considerar inexigíveis multas punitivas e moratórias nas cobranças referentes a competências anteriores a fevereiro de 2023, tanto para os contribuintes que deixaram de recolher tributos em razão de decisão judicial quanto para aqueles que não possuíam decisão favorável. Em debate, o relator, ministro Barroso, sinalizou que poderia mudar seu voto para também afastar a exigência de multas, mas apenas as punitivas e para aqueles contribuintes que possuíam decisão judicial.

O ministro Luiz Fux inaugurou a terceira posição, votando por modular os efeitos da nova tese, para que ela passe a valer somente a partir de fevereiro de 2023. Com isto, as cobranças, sem ação rescisória, de competências anteriores a fevereiro deste ano seriam inválidas. Acompanhou este entendimento o ministro Fachin, que também sinalizou que, caso o entendimento do ministro Fux não formasse maioria, iria aderir ao voto do ministro André Mendonça, no tocante ao cancelamento das multas contra os contribuintes.

Em seu voto, o ministro Fux ressaltou que a tese dos Temas 881 e 885 se trata de um entendimento novo no STF e que, portanto, não poderia retroagir, isto é, produzir efeitos para o passado, o que prejudicaria os contribuintes que até então consideravam que o Fisco deveria fazer uso da ação rescisória para afastar a coisa julgada. Afirmou que, por se tratar de um entendimento novo, os contribuintes estavam sendo surpreendidos com o STF estar considerando válidas as cobranças das competências anteriores a fevereiro em casos em que não houve o ajuizamento de ação rescisória. Concluiu que a modulação de efeitos é a solução que mais garante a segurança jurídica e a confiança da sociedade nas instituições, necessários, por exemplo, para estimular o ambiente de negócios no Brasil e o crescimento econômico.

Estava ausente na sessão o ministro Nunes Marques. Antes de pedir vista, o ministro Toffoli sinalizou que acompanharia o voto do ministro Fux. Quando o julgamento for retomado, todos os ministros que já votaram poderão alterar seus votos, o que se espera que ocorra, porque a ausência de modulação de efeitos não se mostra a solução jurídica mais correta para esta discussão.

Vinícius Krupp

Advogado na P&R Advogados Associados

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