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11/11/2022

STF prossegue no julgamento do DIFAL: Já há 5 votos pela anterioridade de exercício

11/11/2022

Na última sexta-feira (04/11), o STF retomou o julgamento das ADIs 7066, 7070 e 7078, que discutem a constitucionalidade da exigência do DIFAL nas operações interestaduais de venda de mercadorias a consumidores finais não contribuintes do ICMS durante o exercício de 2022. A controvérsia se estabeleceu em razão de que Lei Complementar nº 190/2022, que dispôs sobre as regras gerais para a cobrança do tributo, somente foi publicada em 05/01/2022, portanto, já no curso deste ano. Diante disso, argumentam os contribuintes que devem ser respeitadas as garantias constitucionais da anterioridade nonagesimal e de exercício, de modo que o tributo somente seria validamente exigível a partir de janeiro de 2023 (o tema foi tratado em artigo anterior, aqui).

O voto proferido pelo Min. Relator, Alexandre de Moraes, foi no sentido de que essas garantias não seriam aplicáveis à situação em exame, de modo que não haveria óbice à cobrança pelos Estados e pelo Distrito Federal desde a publicação da LC nº 190/2022. Em seu voto, ele se posicionou, inclusive, pela declaração da inconstitucionalidade do art. 3º da referida lei, na parte em que faz remissão ao dispositivo constitucional da anterioridade. O entendimento adotado pelo Min., no entanto, trazia alguns aspectos criticáveis, como se examinou em outro texto publicado por oportunidade da disponibilização do voto (aqui), especialmente porque contrariava premissas do julgamento anterior do STF sobre o DIFAL (ADI 5.469/DF e RE 1.287.019/DF – Tema 1.093).

Com o prosseguimento do julgamento, o Min. Dias Toffoli, que havia pedido vista, apresentou seu voto abrindo divergência e se posicionando pela necessidade de observância apenas ao prazo de noventa dias a contar da publicação da LC nº 190/2022. O raciocínio construído por ele foi o de que as garantias constitucionais da anterioridade nonagesimal e de exercício não seriam, a rigor, aplicáveis à lei complementar, na medida em que versa sobre as regras gerais do imposto, mas não enseja “instituição” ou “majoração” de tributos. Não obstante, o Min. traçou uma reconstrução histórica da tramitação do projeto de lei que deu origem à LC nº 190/2022, para concluir que a intenção do legislador seria a de conceder noventa dias aos contribuintes e que essa concessão não implicaria invasão da competência tributária dos Estados e do DF.[i]

Em seguida, o Min. Edson Fachin disponibilizou seu voto, inaugurando uma terceira posição, pela necessidade de observância das anterioridades nonagesimal e de exercício. Para ele, as garantias constitucionais da anterioridade são aplicáveis à situação em exame e, além disso, as regras da anterioridade são indissociáveis no que se refere ao ICMS, não se cogitando da aplicação apenas da noventena, em detrimento da anterioridade de exercício. Segundo o Min. Fachin, “há muito a jurisprudência [do] STF é no sentido de que qualquer medida que corresponda a instituição e/ou aumento do ônus tributário deve necessariamente observar o princípio da anterioridade do exercício independente do veículo legislativo que a introduz”. Nessa esteira, concluiu que “a Lei Complementar em matéria tributária de igual modo deve observar ambas as regras da anterioridade tributária, sobretudo, quando dispõe acerca do DIFAL que correspondem à autênticas regras de atribuição de competências tributárias aos estados destinatários das operações”. O Min. rechaçou, ainda, o argumento dos Estados de que o DIFAL se trataria de uma mera repartição do produto da arrecadação do ICMS, reafirmando as premissas estabelecidas no anterior julgamento da Corte (Tema 1.093), segundo as quais a exigência desse tributo sobre as vendas interestaduais a consumidor final não contribuinte constituiu “nova obrigação tributária correspondendo, assim, à instituição e/ou aumento de tributo”.

O voto do Min. Edson Fachin é, até o momento, o que traz as razões mais coerentes em relação ao decidido pelo Plenário da Suprema Corte no Tema 1.093 e o que atribui o sentido mais adequado às garantias da anterioridade à luz da Constituição e da jurisprudência consolidada do próprio STF. Já aderiram a essa posição a outros quatro Ministros: Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, André Mendonça e Rosa Weber. Com isso, dos sete votos disponibilizados até agora, cinco deles se firmaram em favor da tese dos contribuintes pela necessidade de observância da anterioridade de exercício. O julgamento, no entanto, foi novamente interrompido com pedido de vista do Min. Gilmar Mendes.

O escritório permanecerá acompanhando o julgamento e à disposição para qualquer esclarecimento sobre o tema.

Luis Carlos Fay Manfra,

Advogado na P&R Advogados Associados.

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[i] O raciocínio construído pelo Min. Dias Toffoli é criticável. Em primeiro lugar, porque desconsidera, ou flexibiliza, o fato de que o texto deliberadamente escolhido pelo legislador não concedeu “noventa dias” aos contribuintes, mas fez uma remissão explícita ao dispositivo constitucional da anterioridade nonagesimal (art. 150, III, ‘c’, da CF/88), o qual, por sua vez, faz uma remissão ao dispositivo que trata da anterioridade de exercício (art. 150, III, ‘b’, da CF/88), em uma cadeia de remissões que não permite a conclusão de que apenas uma das anterioridades haveria de ser observada. Em segundo lugar, exatamente porque cria uma cisão entre anterioridade nonagesimal e de exercício que não é admitida pelo texto constitucional em relação ao ICMS. E, em terceiro lugar, porque parte de uma interpretação restritiva da garantia da anterioridade, com base na literalidade do texto constitucional, quando faz referência às palavras “instituiu” e “aumentou”, jurisprudência do STF, historicamente, sempre adotou a interpretação de que a majoração de tributos, ainda que de forma indireta, também haveria de respeitar à anterioridade, compreendendo essa garantia não apenas enquanto regra, mas também enquanto princípio derivado da segurança jurídica – tradição esta que foi consagrada no voto do Min. Edson Fachin, também abordado neste texto.

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