Não será obrigatório incluir todas as dívidas sobre o tema, nem a multa de 150%
Contribuintes que negociarem com a Fazenda Nacional dívidas tributárias referentes a ágio – na chamada transação – não precisarão abrir mão de discutir a totalidade da autuação fiscal. Poderão ficar de fora a multa e discussões sobre outros tipos de ágio. As orientações estão em parecer que será publicado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) hoje. O prazo para pedir a adesão encerra-se no fim deste mês.
As discussões de ágio envolvem em torno de R$ 150 bilhões, segundo projeção da Fazenda Nacional. Com o parecer, pode haver um estímulo à adesão da transação do ágio. Isso porque a norma tira dúvidas que os advogados têm manifestado à procuradoria, desde que o Edital nº 9/2022, sobre a negociação dessas dívidas – geralmente de altos valores – foi aberto.
“O parecer sobre a transação do contencioso tributário do ágio vem pavimentar as vias de consenso em torno do tema para a redução de litígio”, antecipou ao Valor o procurador-geral da Fazenda Nacional, Ricardo Soriano de Alencar. Para ele, a norma cria um “canal aberto e transparente” para as empresas tomarem a melhor decisão em direção à sustentabilidade dos seus negócios, com segurança jurídica e tranquilidade.
A transação foi instituída em fevereiro de 2020, por meio da Lei nº 13.988. O Fisco, desde então, tem permissão para sentar à mesa e negociar com devedores, não importa o valor da dívida. Até maio, foram regularizados um total de R$ 294,8 bilhões em 1,3 milhão de acordos firmados via transação. Em 2021 foram recuperados aos cofres públicos R$ 31,7 bilhões.
Atualmente, podem ser incluídos valores já inscritos em dívida ativa e casos que ainda estão em discussão na esfera administrativa ou judicial. A chamada “transação do contencioso” foi aberta, primeiro, para autuações ligadas a programas de participação em lucros e resultados (PLR) e, mais recentemente, para o ágio.
Por causa do primeiro edital, sobre PLR, a procuradoria já imaginava eventuais dúvidas que surgiriam por parte dos advogados, em relação a ágio, segundo explica a procuradora-chefe do Laboratório de Jurimetria e Inovação Jurídica Sara Carcará.
Nas discussões sobre ágio, é comum que o contribuinte trate de mais de um assunto (tese) no mesmo processo. A PGFN separou cinco que serão considerados independentes: transferência do ágio pago; pagamento do ágio por meio de empresa veículo; requisitos do laudo de avaliação do ágio; amortização do ágio interno formado entre partes relacionadas; e a adição das despesas de amortização de ágio na apuração da base de cálculo da CSLL.
A procuradoria admitirá, por exemplo, que o contribuinte opte por aderir à transação em relação a todos os casos de amortização do ágio interno, mas, ao mesmo tempo, persista discutindo no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) ou no Judiciário a possibilidade de pagamento do ágio por meio de empresa veículo.
“O parecer mostra a disposição da PGFN em esclarecer, em tempo razoável, dentro do prazo, para dar segurança ao contribuinte que quiser aderir”, afirma João Grognet, procurador-geral adjunto de gestão da dívida ativa da União e do FGTS substituto.
O parecer da PGFN também orienta que desistir da discussão sobre o mérito não exige a desistência do litígio sobre a multa. A medida é importante porque é comum as empresas questionarem a aplicação da chamada multa qualificada, que dobra a penalidade regular de 75% para 150% quando a Receita Federal vê indícios de fraude ou simulação.
Contudo, não poderão ser incluídos na proposta de adesão à transação fatos que possam, mas ainda não geraram, autuação fiscal na data de publicação do edital que autorizou a negociação das dívidas de ágio.
Alguns advogados, no entanto, dizem que as condições para a transação dos casos relativos a ágio ainda não seriam as melhores. Eles comparam com a transação regular (não por edital), que agora permite o uso de prejuízo fiscal para pagamento dos débitos incluídos no acordo.
Outros tributaristas lembram que as chances de vitória de discussões sobre ágio na Justiça ainda são grandes para os contribuintes. Eles consideram que já há um precedente conhecido e favorável ao pedido da empresa (Resp n° 1988316), que aguarda julgamento no Superior Tribunal de Justiça (STJ), embora também exista um outro, desfavorável (Resp n° 18086396).
Levantamento, publicado em maio pelo Valor, mostra que tramitam ao menos 55 processos judiciais sobre o tema e há decisões de primeira e segunda instâncias em pouco mais da metade dos casos – nove a favor do contribuinte, 14 contra e quatro com resultado parcial, como redução da multa de 150% aplicada pela fiscalização.
A Receita Federal e a PGFN não divulgam estimativa do quanto poderá ser recuperado com a transação de discussões sobre ágio porque isso depende da adesão dos contribuintes. Mas a Receita Federal contabiliza 322 processos no Carf e 55 em primeiro grau. Esses julgamentos, geralmente, dependem do “caso a caso”, de como foi feita cada operação e a motivação para o pagamento do ágio.
Fonte: Valor Econômico.