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30/10/2020

Carf cancela multa com base em nova norma

30/10/2020

Contribuinte conseguiu reverter jurisprudência

Por Beatriz Olivon e Joice Bacelo

A Câmara Superior, última instância do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), pela primeira vez deu razão ao contribuinte em um caso de empate. Com isso, mudou um entendimento que se repetia em várias decisões: a incidência concomitante de multa isolada e de ofício.

O contribuinte nunca ganhava essa discussão, pois praticamente todas as decisões eram definidas por voto de qualidade. Quando havia empate, o presidente da turma, sempre um representante da Fazenda, decidia.

Essa sistemática, porém, deixou de valer em abril, com a Lei nº 13.988. Um novo artigo, o 19-E, foi incluído na Lei nº 10.522, de 2002, prevendo que quando há empate o contribuinte sairá vencedor. Por isso, agora, a reversão do entendimento.

A multa de ofício pode ser aplicada quando o contribuinte deixa de pagar o tributo de forma correta. São 75% sobre o total devido. Já a multa isolada, de 50%, pode ser cobrada por falta do recolhimento por estimativa.

Essa modalidade é direcionada às empresas que estão no lucro real – as que faturam acima de R$ 78 milhões por ano. O cálculo do Imposto de Renda é feito mês a mês, com base em uma previsão de lucro, e no fim do ano é realizado o encontro de contas: se pagou menos durante o ano, completa o valor devido, se pagou mais, fica com saldo para quitar tributos futuros.

O julgamento que mudou a jurisprudência desse tema, proibindo a concomitância das multas, ocorreu na 1ª Turma da Câmara Superior. O caso envolve a Viação Campo Belo, que atua com transporte de passageiros e cargas (processo nº 10665. 001731/2010-92).

A empresa foi autuada por ter deduzido, na apuração anual, valores de estimativas que não haviam sido efetivamente recolhidos. Consta no processo que os pagamentos foram realizados por meio de compensação, com o uso de saldos de IRPJ e de CSLL de anos anteriores. Só que as compensações teriam sido feitas com base nos livros fiscais, ou seja, sem a transmissão da Declaração de Compensação – o que não é permitido.

A Receita Federal aplicou os 75% de multa de ofício em razão das deduções feitas no fim do ano e cobrou a multa isolada, de 50%, por entender que as estimativas haviam deixado de ser pagas. As autuações referem-se aos anos de 2006 e 2007. A Câmara Superior julgou, então, a concomitância das multas.

A relatora do processo é a conselheira Andréa Duek Simantob, presidente da 1ª Turma da Câmara Superior. Ela votou para permitir que as duas multas fossem aplicadas, seguindo a jurisprudência do Carf.

Essa discussão gira em torno da Lei nº 11.488, de 2007, que reduziu a multa isolada de 75% para 50%. O Carf tem uma súmula, a de nº 105, que veda a concomitância das multas. Mas essa súmula é anterior à lei.

Para a relatora do caso, a legislação de 2007 não apenas reduziu o percentual, mas mexeu nas hipóteses de incidência e, por esse motivo, não se poderia mais aplicar a súmula aos julgamentos – já que esse texto havia sido fixado em um outro contexto, antes da mudança na legislação.

A turma é composta por oito conselheiros – metade representa a Fazenda e a outra os contribuintes. A relatora e os três fazendários julgaram o tema da mesma forma, ou seja, para permitir a concomitância das multas. Já os quatro conselheiros que representam os contribuintes divergiram. Para eles, isso não pode ocorrer.

Se o voto de qualidade tivesse sido aplicado, o contribuinte teria saído derrotado. Sem ele, porém, a jurisprudência virou. Prevaleceu o voto do conselheiro Caio Cesar Nader Quintella. A Súmula 105, para ele, deve continuar sendo aplicada mesmo depois da Lei nº 11.488. O entendimento é de que a multa maior absorve a menor.

“Um único ilícito tributário e seu correspondente singular dano ao erário (do ponto de vista material), não pode ensejar duas punições distintas, devendo ser aplicado o princípio da absorção ou da consunção, visando repelir esse bis in idem”, afirma, no voto. A multa isolada, de 50%, cobrada da empresa foi cancelada.

Especialista em tributação afirma  que as turmas baixas do Carf têm aplicado o voto de desempate em favor do contribuinte. A maior parte, ele afirma, envolve IR de pessoa física.

Já a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) diz, por meio de nota, que a inversão da jurisprudência é consequência da opção legislativa prevista na Lei nº 13.988. Afirma ainda que isso “tende a ocorrer em todas as teses relevantes que eram julgadas a favor da Fazenda Nacional com o voto de qualidade”, o que inclui temas inclusive com decisões judiciais favoráveis ao Fisco. Entre elas, cita, a aplicação da trava de 30% para a compensação de prejuízos quando há extinção da pessoa jurídica.

Fonte: Valor Econômico

 

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