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28/01/2019

Acordo entre PGFN e SERASA – as informações sobre a dívida tributária com a União viraram “produto”?

28/01/2019

A partir de 1° de março do presente ano, a Procuradoria da Fazenda Nacional – PGFN passará a implementar o Acordo de Cooperação Técnica n° 001/2017, assinado em janeiro de 2017 com a SERASA S.A., conhecido órgão privado de proteção ao crédito.

Segundo os termos do referido Acordo, o que passará a ocorrer será a utilização, por parte da PGFN, de ferramentas de que dispõe a SERASA acerca da situação das pessoas físicas e jurídicas. Dentre elas, estão: (i) os bancos de dados da SERASA, que são mais atualizados que os da Fazenda Nacional, com endereços e telefones de consumidores; (ii) a relação de contribuintes que têm registro de falência e recuperação judicial; e (iii) a classificação, feita por software da SERASA, dos devedores da dívida ativa da União de acordo com a propensão de pagamento.

Em  contrapartida, a União disponibilizará à SERASA S.A. o seu banco de dados completo de supostos devedores da União que tenham débitos inscritos em dívida ativa.

A princípio, causa espanto o fornecimento de informações fiscais de contribuintes a uma empresa privada cujo objeto social é justamente a venda de informações dos cidadãos economicamente ativos.

Diante disso, a PGFN já se antecipou e esclareceu que as informações passadas à SERASA não estariam protegidas por sigilo fiscal – este garantido pela própria Constituição Federal (arts. 5°, X e XII), o qual é representativo de direito fundamental inviolável. Segundo o órgão, isso se dá por conta da previsão do art. 198, § 3°, II do CTN, que excetua a dívida ativa como albergada pela proteção constitucional do sigilo fiscal. Ainda, conforme a PGFN, essas informações já poderiam, inclusive, ser consultadas na internet por qualquer um que deseje saber se determinado contribuinte está com débito federal inscrito na dívida ativa da União. Basta saber seu CPF ou CNPJ.

Há brutais ilegalidades e inconstitucionalidades contidas neste acordo. É que as informações até podem ser públicas, mas isso não significa que possam ser compartilhadas como se “produto” fosse para auferir vantagens econômicas e mesmo eventualmente jurídicas.

É certo, contudo, que, à luz da Constituição Federal, esta verdadeira relativização do sigilo fiscal, não prevista nestes termos no Código Tributário Nacional (art. 198, §3°, II), não autoriza que essas informações sejam utilizadas como insumo a uma organização privada, cujo objeto social consiste no processamento de dados e venda de informações categorizadas e sistematizadas, cujo controle da utilização é perdido a partir daí. Aliás, é ver-se o escândalo da utilização sub-reptícia de dados e informações das pessoas (Facebook), para concluir-se que se dá um passo enorme em direção ao ferimento da garantia fundamental da privacidade e do sigilo de dados fiscais.

Ainda, é certo que há manifesta imoralidade em conceder ao SERASA dito insumo, a saber: a base de dados da PGFN com informações completas e atualizadas (diariamente, diga-se, ainda que nem sempre de forma correta) de todos os supostos devedores da União. Portanto, com o ferramental eletrônico de que dispõe o SERASA, o processamento dessa “big data” trará novos produtos que serão vendidos às instituições de crédito, com base em estatísticas mais precisas que a de qualquer outro player do mercado – o que lhe trará inegável vantagem econômica.

E mais, é certa a violação da intimidade dos contribuintes (protegida pelo art. 5°, X, da CF), tendo em vista que essa vulneração em massa das suas informações acarretará maior dificuldade na obtenção de crédito perante as instituições que se utilizam dos serviços do SERASA.

Por fim, destaque-se que, além de imoral (que por si só já fere o caput do art. 37 da CF/88), o ato é manifestamente ilegal e inconstitucional, pois a Constituição Federal exige que a atuação da administração pública esteja vinculada à lei (arts. 37 e 5°, II, da CF/88) e, no momento, não há lei vigente que autorize o pretenso compartilhamento de informações. De fato, a lei que se prestará para tanto é a Lei Geral de Proteção de Dados, Lei n° 13.709/2018, a qual já foi publicada, mas somente entrará em vigor em 20 de dezembro de 2020, de modo que o ato não está embasado por qualquer lei que autorize a PGFN a praticá-lo.

Nessa ótica, entendemos que é possível questionar, em Juízo, a constitucionalidade e a legalidade do Acordo de Cooperação Técnica n° 001/2017, firmado entre a PGFN e a SERASA S.A, em especial naquilo que possa causar lesões concretas na esfera jurídica dos contribuintes.

Cláudio Leite Pimentel

Pedro Henrique Costa Adams

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