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19/10/2018

STJ afasta prescrição em caso de restituição de tributo inconstitucional

17/10/2018

Decisão da 1ª Turma favorece contribuinte em caso sobre cota-café. Tema deve chegar à 1ª Seção

Jamile Racanicci

Quando começa a contar o prazo prescricional para os contribuintes pedirem a restituição de valores pagos indevidamente como cota de contribuição do café, tributo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2004? De um lado, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) argumentou que o prazo de dez anos se iniciou quando a empresa pagou o tributo, de 1984 a 1990. De outro, o contribuinte pediu que a contagem comece em fevereiro de 2005, quando entrou em vigor a última retificação da lei nº 10.522/2002, por meio da qual a Receita Federal e a Fazenda acolheram formalmente o entendimento do Supremo.

Por unanimidade, na última terça-feira (16/10) a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o prazo começa a contar a partir da lei que determinou a desistência dos recursos por parte da PGFN. Na visão dos ministros, a lei configurou uma confissão de dívida por parte da Fazenda. “O tributo é inconstitucional e eu [Fazenda] recebi valores indevidamente, então devo devolver”, explicou a presidente da turma e relatora do caso, ministra Regina Helena Costa, durante o julgamento.

A turma tomou a decisão ao apreciar o Resp nº 1.556.957/ES, que opôs a Guimarães Café Ltda e a Fazenda Nacional. É a primeira vez que o colegiado toma a decisão mais favorável ao contribuinte no âmbito de um recurso especial. Em junho de 2017, a turma havia adotado o posicionamento por maioria, ao analisar o agravo no REsp nº 722.077/ES.

Naquela ocasião, ficou vencido apenas o ministro Sérgio Kukina. Na terça-feira, o magistrado se curvou ao entendimento da turma apesar do posicionamento pessoal. Porém, o magistrado pode votar com a própria convicção caso a PGFN leve a controvérsia à 1ª Seção da Corte.

Antes do julgamento do ano passado, a jurisprudência da 1ª Turma e a da 2ª Turma do STJ era mais favorável à Fazenda Nacional. A decisão da última terça-feira consolidou uma mudança no posicionamento da 1ª Turma, agora mais alinhada com o que defendem os contribuintes.

Com esta divergência entre as turmas, a PGFN deve levar o tema para apreciação da 1ª Seção.

A 1ª Seção reúne os ministros de ambas as turmas de Direito Público da Corte e é responsável por pacificar controvérsias quando os colegiados tomam decisões divergentes.

Resistência em restituir

No processo da Guimarães Café, a 1ª Turma entendeu que o prazo prescricional para o contribuinte pedir a restituição começaria a contar a partir de 2005, quando ocorreu a última retificação na lei nº 10.522/2002, por meio da qual a Fazenda acatou o entendimento do Supremo em relação à cota de café.

Como a empresa solicitou em 1996 a devolução dos valores pagos a título do tributo inconstitucional, o STJ entendeu que o pedido não estava prescrito e que a Fazenda Nacional deveria devolver o que foi recolhido indevidamente.

Durante o julgamento, a presidente da turma, ministra Regina Helena Costa, criticou a União pela resistência em restituir os contribuintes e argumentou que a Fazenda deveria devolver os valores espontaneamente, sem necessidade de determinação judicial.

É de se lamentar que precisemos ter essas discussões. Mas é porque, apesar de o STF declarar o tributo inconstitucional, classicamente o fisco nunca os devolveu.

Ministra Regina Helena Costa, do STJ

A partir de 2005, a lei nº 10.522/2002 desobrigou a Receita de fazer lançamentos, inscrever débitos em Dívida Ativa e ajuizar execuções fiscais contra contribuintes que deixaram de recolher a cota de café. Ainda, a lei definiu que a declaração de inconstitucionalidade não determinou que a Receita Federal restituiria os valores de ofício. Diante disso, a 1ª Turma entendeu que a lei condiciona a devolução dos valores ao requerimento feito pelo contribuinte, mas não impede a restituição como um todo.

O ministro Napoleão Nunes Maia Filho salientou que impossibilitar a restituição prejudicaria os contribuintes que, de boa-fé, recolheram o tributo nas décadas de 1980 e 1990. Como a Fazenda deixou de cobrar os débitos pendentes, os contribuintes então devedores teriam recebido um tratamento tributário melhor que os bons pagadores.

Premiaria quem não pagou. Quem não pagou não vai pagar, e quem pagou fica pago. Foi muito besta, não deveria ter pago

Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do STJ

A lei nº 10.522/2002 lista dez tributos declarados inconstitucionais pelo STF, em relação aos quais a Fazenda deveria deixar de constituir o crédito tributário. A maioria foi instituída nos anos 1980 e o mais antigo, chamado taxa de licenciamento de importação, data de 1953. O décimo tributo é a cota café, acrescentada em 2004.

A partir de 2004, em casos de jurisprudência pacífica a lei passou a autorizar que a própria PGFN determine internamente a desistência de recursos por meio de ato declaratório ou de parecer técnico, sem necessidade de alongar a lista por meio de lei ordinária.

Embora esta decisão do STJ se aplique apenas à Guimarães Café no contexto da cota de café, os contribuintes podem usar o precedente para argumentar a favor de um prazo prescricional mais benéfico em processos de outras empresas.

Além disso, a PGFN teme que o Judiciário se baseie neste precedente para afastar a prescrição também em casos relacionados aos outros nove tributos inconstitucionais listados na lei. Questionada, a procuradoria não forneceu uma estimativa do impacto fiscal relacionado a estas possíveis implicações do julgamento do STJ.

Fonte: JOTA

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