A Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) foi instituída pela Instrução Normativa SRF nº 129, de 19 de dezembro de 1986, quando ainda era denominada Declaração de Contribuições e Tributos Federais. Na época, seu objetivo principal era apenas informar os débitos tributários apurados, sem a estrutura de consolidação de créditos e débitos que possui atualmente. Com a evolução normativa e tecnológica, surgiu a DCTFWeb.
Com o tempo, essas declarações tornaram-se as principais ferramentas de confissão de débitos tributários federais perante o Fisco, configurando uma obrigação acessória consistente no dever de prestar informações de interesse da administração tributária.
“Uma das mais importantes obrigações tributárias acessórias, na área federal, aliás, é a de apresentação mensal ou semestral de informações acerca da maior parte dos tributos federais administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil através da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF).”[1] (grifos)
Além de instrumentalizar a arrecadação e o controle fiscal, a declaração confere segurança jurídica à constituição do crédito tributário, produzindo efeitos materiais e sendo suficiente para constituí-lo, dispensando o Fisco de qualquer outra providência, inclusive do lançamento de ofício. Tal entendimento está consolidado na Súmula nº 436 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que a entrega da declaração constitui o crédito tributário. Assim, a DCTF agiliza a cobrança e garante eficiência ao sistema, consolidando-se não apenas como mecanismo de fiscalização, mas também como ferramenta essencial na relação obrigacional entre contribuinte e Estado.
A DCTF, por constituir confissão de dívida, pode ser objeto de retificação pelo contribuinte, seja para corrigir inexatidões formais – como, por exemplo, alterar a forma de quitação dos débitos ou corrigir o código de receita –, seja para alterar valores de tributos declarados – como na inclusão de débitos omitidos ou na correção de valores declarados a menor. Nessas hipóteses, a Receita Federal não apenas admite, mas exige a retificação, a fim de assegurar a integridade das informações prestadas, impondo sanções em caso de omissões ou informações incorretas.
A controvérsia central recai sobre os efeitos prescricionais da retificação da DCTF. O Código Tributário Nacional, em seu art. 174, parágrafo único, inciso IV, dispõe que a prescrição se interrompe por qualquer ato inequívoco do devedor que importe em reconhecimento do débito, hipótese que abrange a declaração feita pelo próprio contribuinte. Nesse cenário, discute-se se a apresentação de uma DCTF retificadora deve ser considerada novo reconhecimento da dívida e se pode interromper o prazo prescricional de cinco anos para o ajuizamento da execução fiscal pela Fazenda Pública.
A jurisprudência dos Tribunais Superiores vem consolidando entendimento no sentido de que a retificação meramente formal, sem alteração do valor do débito confessado na declaração original, não constitui novo reconhecimento da dívida. Nessas hipóteses, o prazo prescricional continua a fluir a partir da entrega da primeira DCTF, de modo que eventual execução ajuizada após cinco anos deve ser considerada fulminada pela prescrição. Em contrapartida, quando a retificação é material e modifica valores ou reconhece débitos anteriormente inexistentes, o ato configura nova confissão de dívida, interrompe o prazo prescricional e determina o reinício da contagem do quinquênio que a Fazenda dispõe para promover a cobrança.
Esse entendimento foi reiteradamente confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça, tanto pela Primeira quanto pela Segunda Turma, que destacaram a diferença entre retificação formal e material para efeitos de prescrição. No âmbito administrativo, embora o CARF não tenha enfrentado diretamente a questão, um acórdão recente fez referência ao despacho anterior que mencionava a Portaria PGFN nº 502/2016. Esse ato normativo apresenta uma lista exemplificativa de matérias com jurisprudência consolidada no STF e no STJ e orienta a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a dispensar a apresentação de contestação e de recursos nessas hipóteses.
Diversos outros precedentes têm sido aplicados não apenas pelo STJ, mas também pelos Tribunais Regionais Federais e Tribunais Estaduais, reforçando a uniformidade desse entendimento. Sobre o tema, Sabbag (2022, p. 493) esclarece:
“É sabido que, segundo a Corte Superior (Súmula n. 436 do STJ), a entrega da declaração (v.g., a DCTF, a GIA) constitui o crédito tributário, abrindo-se para a demarcação do termo “a quo” de prescrição. (…) É importante esclarecer que declaração retificadora não será causa interruptiva de prescrição, com suporte no art. 174, parágrafo único, IV, do CTN, se vier apenas para corrigir equívocos formais da declaração anterior.”[2]
A distinção entre retificação formal e material é, portanto, indispensável para a preservação da segurança jurídica. Permitir que meras correções formais reabram o prazo prescricional representaria esvaziar a função da prescrição no direito tributário, além de possibilitar que a Fazenda se valha de expedientes para ampliar indefinidamente seu direito de cobrança. Se a execução fiscal tiver por base declaração retificada apenas em seus aspectos formais, mas sem alteração do valor devido, o crédito estará prescrito e sua extinção deverá ser reconhecida pelo Poder Judiciário.
Não raras vezes, entretanto, a Fazenda Nacional ajuíza execuções fiscais visando à cobrança de créditos já alcançados pela prescrição, sem atentar para o fato de que a retificação não modificou a confissão de dívida. Em outros casos, mesmo ciente do entendimento consolidado na jurisprudência, insiste na cobrança de valores extintos pelo decurso do tempo, em afronta às suas próprias normas internas, como previsto na Portaria PGFN nº 502/2016, já mencionada.
O escritório P&R Advogados Associados se coloca à disposição para possíveis esclarecimentos sobre o tema.
Rafael Sibinel
Advogado na P&R Advogados
[1] PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 14. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023. p. 413.
[2] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 16. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2024. p. 1418