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31/07/2025

Majoração do IOF em 2025: a crise entre os Poderes e os limites ao poder regulamentar

A edição de decretos presidenciais que elevaram as alíquotas do IOF em 2025 desencadeou um dos episódios mais relevantes de tensão institucional entre os Poderes da República no campo tributário. Embora a Constituição Federal autorize o Executivo a modificar as alíquotas desse imposto por decreto (art. 153, §1º), a reação do Congresso Nacional que aprovou, por ampla maioria, a sustação desses atos, evidenciou os limites materiais e políticos dessa prerrogativa.

A primeira medida do Governo foi a publicação do Decreto nº 12.466/2025, em maio, com a justificativa de reforçar o ajuste fiscal. O impacto previsto era de R$ 20,5 bilhões em 2025 e R$ 41 bilhões em 2026. Entretanto, a medida, foi duramente contestada pelos parlamentares, que entenderam o ato como abuso do poder regulamentar e, por ampla maioria, sustaram os efeitos do ato presidencial, culminando na promulgação do Decreto Legislativo nº 176/2025.

A justificativa formal do Congresso foi clara ao afirmar que o IOF, por sua natureza extrafiscal, não poderia ser manipulado com finalidade exclusivamente arrecadatória. Foi a primeira vez desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 que o Congresso Nacional exerceu essa prerrogativa, disposta no art. 49, V, da CF, com êxito em matéria tributária. Desde então, nenhum ato normativo de natureza tributária havia sido invalidado por esse mecanismo.

Diante da derrota política, o Executivo recorreu ao Judiciário, quando em 1º de julho, a Advocacia Geral da União ajuizou ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, alegando que o Congresso havia invadido competência privativa do Executivo e comprometido a condução da política econômica.

Em decisão liminar, o ministro Alexandre de Moraes proferiu decisão liminar suspendendo temporariamente os efeitos tanto do decreto legislativo quanto do decreto presidencial e convocou uma audiência de conciliação entre Executivo e Legislativo, que foi realizada no dia 15 de julho.

Como a audiência restou infrutífera, o Ministro proferiu decisão, em 17 de julho, restabelecendo os efeitos do Decreto nº 12.499/2025, mantendo quase integralmente o decreto do Executivo, com exceção da tributação sobre as operações conhecidas como “risco sacado”, modelo utilizado por grandes varejistas para antecipação de recebíveis.

Assim, a majoração do IOF foi validada, com a única exclusão desse ponto específico, em respeito à manifestação do Congresso e às distorções apontadas.

A controvérsia evidenciou o conflito entre a função extrafiscal do IOF que, por previsão constitucional (art. 153, §1º), admite a alteração de alíquotas por decreto e os limites impostos pelos princípios da legalidade tributária, da separação dos poderes e do controle político exercido pelo Congresso Nacional.

Essa instabilidade gerada por esse conflito comprometeu o planejamento de instituições financeiras e empresas, impactando diretamente operações de crédito, câmbio e seguros.

O conflito evidenciou a fragilidade do modelo vigente no país que admite alterações significativas na carga tributária por meio de atos infralegais, sem mecanismos prévios de controle ou moderação. Além disso, a ausência de consenso entre os Poderes e a necessidade de intervenção do STF reforçam a urgência de um aprimoramento institucional.

Enquanto medidas de arrecadação imediata, como o aumento do IOF, são adotadas sem respaldo legislativo claro, propostas de maior impacto estrutural, como a revisão de renúncias fiscais ou a limitação de emendas parlamentares, seguem paralisadas. Essa assimetria compromete a coerência da política fiscal e acentua a judicialização como instrumento de enfrentamento de impasses estruturais.

Em síntese, a crise envolvendo o IOF revelou não apenas os riscos do uso abusivo do poder regulamentar, mas também a omissão legislativa em oferecer balizas normativas seguras e o papel crescente do Judiciário como árbitro de disputas fiscais complexas.

O episódio reforça a urgência de se regulamentar, por lei complementar, os limites e critérios objetivos para a modulação extrafiscal de tributos, promovendo maior previsibilidade e estabilidade institucional.

O escritório acompanha de perto os desdobramentos normativos e jurisprudenciais envolvendo o IOF e outros tributos federais, e permanece à disposição para orientar os contribuintes na adoção de medidas seguras, sejam de natureza preventiva, corretiva ou contenciosa.

Pedro Paulo Merscher Machado
Advogado na P&R Advogados Associados

 

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