A discussão envolvendo a não incidência de ICMS nas transferências de bens e mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica ganhou novos contornos no último mês de 2023, de modo que o tema deverá ser acompanhado de perto pelos contribuintes no ano de 2024.
Agora, o debate gira em torno do Convênio ICMS n° 178/23, celebrado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) no dia 1º de dezembro de 2023, que produzirá efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024, e da Lei Complementar (LC) n° 204/23, publicada hoje (29/12/2023) no Diário Oficial da União.
Em síntese, na reunião do CONFAZ, ficou estabelecido que, nas operações interestaduais de remessa de produtos entre estabelecimentos do mesmo titular, será obrigatória a transferência dos créditos de ICMS do estabelecimento de origem para o estabelecimento de destino.
Por outro lado, a aludida legislação complementar, oriunda do Projeto de Lei Complementar (PLP) n° 116/23, assegura os créditos ao Estado de destino, limitando a transferência aos percentuais previstos na Constituição Federal, além de assegurar que a unidade federada de origem permanecerá com os créditos “em caso de diferença positiva entre os créditos pertinentes às operações e prestações anteriores” e os créditos transferido ao estabelecimento destinatário. Na prática, portanto, não dispõe o contribuinte do direito de manter seu saldo credor integralmente no estabelecimento remetente.
Sobre o tema, deve-se ter em mente a interpretação conferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) n° 49, ocasião em que se reiterou a não incidência de ICMS nas operações interestaduais entre estabelecimentos de mesma titularidade. Afinal, a referida ADC ainda está em andamento, pois pendem de apreciação embargos de declaração opostos para que, dentre outros aspectos, seja esclarecida, através de reconhecimento expresso, a faculdade do contribuinte em aproveitar os créditos de ICMS no estado de origem ou no estado de destino – que, nos parece,
é o que foi decidido no acórdão da ADC n° 49: a transferência do crédito ao destino seria uma faculdade do contribuinte e não uma obrigatoriedade.
Ocorre que, a despeito de todos os pontos polêmicos e discutíveis, o Convênio ICMS n° 178/23 vem sendo regulamentado pelos Estados. Até o momento, já foram editados o Decreto n° 68.243/23 pelo Estado de São Paulo, o Decreto n° 16.355/23 pelo Estado do Mato Grosso do Sul e o Decreto n° 33.297/23 pelo Estado do Rio Grande do Norte, porém a tendência é que novos decretos estaduais sobre o tema sejam publicados até o dia 31 de dezembro.
Uma solução para essa problemática (além, por óbvio, de tornar facultativa a transferência de créditos) seria possibilitar que o contribuinte opte por transferir mercadorias entre seus estabelecimentos com o destaque e a incidência de ICMS, equiparando essa operação àquela sujeita à ocorrência do fato gerador, a fim de facilitar o aproveitamento do saldo credor. No entanto, o trecho do PLP n° 116/23 que trazia essa previsão acabou sendo vetado pelo Presidente da República ao sancionar a LC n° 204/23 – veto que, por sua vez, pode vir a ser rejeitado pelo Congresso Nacional.
Frente a esse cenário, muitos questionamentos surgem quanto à aplicação prática do Convênio ICMS n° 178/23, de seus respectivos decretos estaduais e da LC n° 204/23, bem como quanto à posição final que será sedimentada pelo Supremo Tribunal Federal na ADC n° 49. A certeza é que a temática envolvendo transferências de bens e mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica permanecerá em evidência no ano de 2024, inclusive com possibilidade de (nova) judicialização.
Não obstante, orientamos que, a partir de 01/01, o procedimento mais seguro será o de seguir a previsão da lei complementar e decretos estaduais, através da transferência dos créditos para o destino. Ainda assim, estamos avaliando os fundamentos para uma provável judicialização do tema no início de 2024.
Assim, a Pimentel & Rohenkohl Advogados Associados fica à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos a respeito do assunto.
Giulia Scheuermann
Advogada na P&R Advogados Associados