Em 2017 o PERT foi instituído pela lei nº 13.496, prevendo a possibilidade de quitação de débitos em aberto tanto no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil quanto da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. Na ocasião, uma empresa aderiu ao Programa, segregando seus débitos, conforme lhe facultava a lei, em 3 (três) modalidades distintas, sendo 2 (duas) junto à RFB e 1 (uma) junto à PGFN. Em todas elas optou pela que permitia o pagamento de um valor à vista, podendo o saldo remanescente ser liquidado com créditos de Prejuízo Fiscal (PF) e Base de Cálculo Negativa de CSLL (BCN).
No mês de março deste ano, foi surpreendida por notificação da RFB informando que os saldos de PF e BCN informados por ela na modalidade referida no PERT RFB – débitos previdenciários, haviam sido validados parcialmente e que haveria saldo a pagar. Com receio da exclusão do parcelamento, optou por quitar o suposto débito e verificar a regularidade da cobrança posteriormente.
Na sequência, em junho de 2023, recebeu nova intimação do Órgão, informando que a RFB havia realizado a validação parcial dos créditos de PF e BCN informados na consolidação do PERT e que restaria saldo devedor a pagar relativo à outra modalidade PERT RFB – demais débitos.
Nesta última intimação, restou expresso que a RFB considerou o saldo disponível dos créditos de PF e BCN dos montantes existentes em 31/12/2015 e declarados pelo contribuinte até 29/07/2016, após utilização em parcelamentos consolidados anteriormente (PRT, PERT PGFN e PERT Previdenciário RFB).
Ocorre que a empresa, com base no artigo 3º, parágrafo único, inciso II da Lei nº 13.496/2017, indicou saldo de PF e BCN do exercício de 2016 para a quitação integral do PERT PGFN, uma vez que este artigo não traz a limitação temporal de 31/12/2015 existente no artigo 2º, § 2º, da Lei nº 13.496/2017 (referente aos débitos no âmbito da RFB).
Foi então que identificou que a Portaria PGFN nº 1.207/2017 impôs a vedação temporal que só estava estabelecida para o parcelamento junto à RFB, prevista na Lei nº 13.496/2017.
No entanto, a lei que instituiu o PERT é hierarquicamente superior à Portaria, ou seja, suas previsões devem ser observadas integralmente, não podendo um ato normativo hierarquicamente inferior dentro do ordenamento jurídico realizar qualquer tipo de restrição àqueles que são superiores. Ademais, a Portaria foi publicada posteriormente ao advento da lei, o que fez com que diversos contribuintes realizassem o pedido de utilização desse crédito antes de existir qualquer limitação, ainda que evidentemente inválida.
O escritório P&R então ingressou com Mandado de Segurança, requerendo, além da liminar para suspensão da exigibilidade do saldo devedor do PERT RFB – demais débitos, o recálculo das três modalidades nas quais aderiu ao PERT, considerando para o PERT PGFN o Prejuízo Fiscal e Base de Cálculo Negativa de CSLL do exercício de 2016.
Requereu também que, após o recálculo, fosse reconhecido o direito a compensar o saldo do PERT RFB – débitos previdenciários quitado em abril de 2023 e a extinção do suposto saldo devedor do PERT RFB – demais débitos, objeto da liminar.
O Juiz da 14ª Vara Federal de Porto Alegre concedeu a liminar considerando que “De acordo com recentes precedentes do STJ e do TRF-4, o art. 1º, I, da Portaria PGFN n.º 1.207/2017, ao limitar a amortização do parcelamento (PERT) de débitos inscritos em dívida ativa mediante aproveitamento de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL existentes até 31 de dezembro de 2015 e declarados até 29 de julho de 2016, inovou indevidamente no ordenamento jurídico, invadindo espaço reservado à lei (art. 155-A do CTN). Ainda de acordo com os precedentes citados, a limitação temporal constante da lei de regência da matéria (Lei n.º 13.496/2017) foi prevista, apenas, para amortização de débitos administrados pela Receita Federal do Brasil (art. 2º, §2º).”
Trata-se de uma decisão importante sob o ponto de vista da legalidade e segurança jurídica aos contribuintes que aderiram ao PERT, pois em que pese o parcelamento especial seja um benefício fiscal, suas regras devem estar previstas em lei, podendo atos infralegais regulamentá-las, mas jamais se sobreporem a elas.
Gabriela Mancuso Firmbach e Isabela Weingärtner Welter
Sócia e Advogada na P&R Advogados Associados.