Por Joice Bacelo
Decisão uniformiza entendimento da Corte sobre o assunto
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu sobre a forma como devem ser calculados os descontos que foram oferecidos no Refis da Crise (Lei nº 11.941, de 2009). Os ministros entenderam que pode haver cobrança de juros sobre a multa perdoada no parcelamento.
Esse julgamento ocorreu ontem na 1ª Seção. Entendimento diferente, impedindo a incidência de juros, provocaria redução do saldo devedor a ser pago pelo contribuinte. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) estimava que, neste caso, a União teria que devolver 5% de tudo o que foi arrecadado com o parcelamento.
Mais do que isso: poderia influenciar em outros parcelamentos. Edições posteriores a de 2009 tem a mesma metodologia de cálculo, também prevendo a cobrança de juros sobre a multa perdoada. Levando em conta somente o Programa Especial de Regularização Tributária (PERT), o último do tipo Refis, disponibilizado no ano de 2017, o impacto para a União seria de mais de R$ 3 bilhões.
O placar, no STJ, ficou em seis votos a três para manter a cobrança de juros. O julgamento, apesar de não ter caráter repetitivo, é importante porque a 1ª Seção uniformiza o entendimento que deve ser adotado pelas turmas que julgam as questões de direito público na Corte. Havia divergência em relação a esse tema: a 1ª tem decisão contra a cobrança dos juros e a 2ª favorável.
O caso julgado pela 1ª Seção envolve a Bettanin Industrial, empresa do segmento de utensílios de limpeza doméstica com sede no Rio Grande do Sul (EREsp 1404931). Segundo consta no processo, a companhia aderiu ao Refis da Crise e optou por pagar a sua dívida tributária à vista, o que deu direito à redução de 100% do valor da multa cobrada sobre os débitos. Para a empresa, é como se a multa tivesse sido extinta e, por esse motivo, não poderia incidir juros desde a data do vencimento do tributo, que no caso em análise, era ano de 2005. Já a Fazenda Nacional defendeu que o cálculo tem de ser feito sobre o valor total, atualizado na data de adesão ao programa, em 2009, ou seja, com os juros incidindo também sobre a parcela da multa.
A PGFN afirma, no processo, que o desconto dos juros de mora, pela lei, eram de 45%, e que pelo cálculo do contribuinte aumentariam para 68%.
Esse julgamento teve início em agosto do ano passado, foi suspenso por pedido de vista e retomado em março. Mas um novo pedido de vista, apresentado pelo ministro Sérgio Kukina, suspendeu novamente as discussões. Ele trouxe o voto ontem, quando esse caso teve, enfim, um desfecho.
Prevaleceu o voto do relator, ministro Herman Benjamin, que deu razão à PGFN. “A redução dos juros de mora em 45% deve ser aplicada após a consolidação da dívida, sobre o montante devido originariamente”, afirmou ao votar, acrescentando “não existi amparo legal para que a exclusão de 100% da multa de mora implique exclusão dos juros”.
O entendimento do relator Herman Benjamin foi acompanhado pelos ministros Og Fernandes, Mauro Campbell, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina e Francisco Falcão.
Napoleão Nunes Maia Filho, que se aposentou no mês de dezembro, havia depositado voto quando o julgamento teve início, em agosto do ano passado. E, naquela ocasião, abriu divergência ao posicionamento do relator.
Para ele, “o acessório acompanha o principal”. “Se a multa não existe mais, não poderia ser invocada para coisa alguma, mormente para a incidência de juros de mora”, disse, na ocasião.
A ministra Regina Helena Costa e o ministro Gurgel de Faria acompanharam a divergência, posicionando-se, portanto, de forma favorável ao contribuinte. Para a ministra, os juros, se mantidos sobre as multas perdoadas, incidiriam sobre bases de cálculo inexistentes. Seria, na sua visão, “ilógico e desarrazoado”.
Regina Helena Costa chamou a atenção, ao votar, que essa matéria motivou divergências dentro da própria administração pública. A Receita Federal, ela disse, entendia inicialmente que não poderia incidir juros sobre as multas perdoadas, enquanto que a PGFN posicionava-se de forma contrária.
Essa questão foi pacificada por meio de uma portaria conjunta, prevalecendo o entendimento da Fazenda Nacional – desfavorável ao contribuinte. “É a administração que interpreta a lei desse jeito”, ela frisou, acrescentando que, na sua visão, frusta o objetivo da Lei do Refis, “que é o de incentivar o pagamento dos débitos em período mais exíguo”.
Fonte: Valor Econômico