Maior crítica é que o redirecionamento pelo Fisco para alcançar bens de sócios e terceiros por dívida de empresa é aplicado após iniciada a ação judicial
O Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, com sede em São Paulo, considerou necessária a abertura de um período para apresentação de defesa antes do redirecionamento da cobrança de tributos (execução fiscal) pela Fazenda Nacional para sócios ou terceiros. O procedimento se chama Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ).
A questão foi analisada pelos 18 desembargadores do Órgão Especial do TRF (processo nº 0017610-97.2016.4.03.0000). O julgamento foi iniciado em outubro de 2019 e retomado na quarta-feira. Após surgirem três diferentes teses nas discussões entre os magistrados, a sessão foi finalizada.
O acórdão ainda não foi publicado. Mas tributaristas concluíram que é necessário o prévio IDPJ para o redirecionamento da execução fiscal quando a pessoa não está incluída na Certidão da Dívida Ativa (CDA) da empresa.
De acordo com o voto vencedor, do desembargador Wilson Zauhy, segundo tributaristas, o IDPJ é “indispensável para a comprovação de responsabilidade em decorrência de confusão patrimonial, dissolução irregular, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato ou ao estatuto social (CTN, artigo 135, incisos I, II e II) , e para a inclusão das pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal, desde que não incluídos na CDA”.
Como o voto do magistrado cita os três incisos do artigo 135 do CTN, protege tutores, administradores de bens de terceiros, inventariantes, prepostos, diretores, gerentes e representantes de pessoas jurídicas de direito privado, entre outros.
Criado pelo Código de Processo Civil (CPC) de 2015, na prática, o IDPJ evita medidas de surpresa do Fisco, como a penhora on-line de recursos financeiros de sócios, ou mesmo de terceiros que representem a empresa. “O advogado, por exemplo, não tem poder de administração, nunca foi sócio da empresa, mas sofre esse redirecionamento, sem direito ao contraditório ou investigação anterior”, diz advogada que atua no processo analisado.
Como a decisão foi proferida por meio da análise de um incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), gerará efeito vinculante para todos os processos sobre o assunto ainda em andamento ou a serem julgados pela Justiça da 3ª Região. Além disso, segundo a advogada, se apresentado recurso contra o acórdão do TRF, ele sobe com força de vinculante para os tribunais superiores.
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), ainda não há previsão de julgamento de recurso repetitivo sobre o tema. Contudo, turmas já decidiram ser necessária prévia instituição do IDPJ para redirecionar execuções fiscais a empresas do mesmo grupo econômico.
Segundo outra especialista entrevistada, todos os processos sobre o tema estavam sobrestados (parados) na 3ª Região. “Com a publicação do acórdão, a Fazenda deverá passar a apresentar o incidente antes do redirecionamento em relação às pessoas não incluídas na CDA, ou o juiz não aceitará o pedido”, afirma.
Para ela, somente se a pessoa já sofreu oneração com a apresentação de garantia no processo judicial fica mais difícil a aplicação da nova diretriz. “Mas há muitos processos parados, antes da apresentação da garantia, aguardando a definição sobre a necessidade de incidente. Inclusive de clientes nossos”, diz.
A maior crítica dos advogados é que o redirecionamento é aplicado pelo Fisco, após iniciada a ação de cobrança, quando não são encontrados bens suficientes para quitar o suposto débito da empresa. “O julgamento do TRF concretiza o devido processo legal possibilitando a apresentação de contestação e provas, dando mais segurança jurídica para o empreendedor”, afirma outro entrevistado.
Por meio de nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) diz que ainda não foi intimada do acórdão do TRF e definirá sua estratégia assim que avaliar seus efeitos práticos. “Por força de lei, a interposição de recursos às Cortes superiores impede automaticamente que o acórdão produza efeitos desde logo”, afirma. O órgão acrescenta que a exigência de IDPJ já foi refutada em julgados do STJ.
Fonte: Valor Econômico