Ao prever as formas de fixação da base de cálculo do ICMS devido em substituição tributária, a Lei Complementar 87/1996 não estabeleceu uma hierarquia entre as possibilidades, deixando-se ao estado tributante a escolher entre as regras disponíveis aquela que lhe convier. Dentre elas está o preço final sugerido pelo fabricante.
Com esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a recurso especial da Avon, que visava afastar o uso do preço de catálogo como base de cálculo para o ICMS em substituição tributária das operações de venda de porta a porta.
O tema foi definido pela corte conforme voto do ministro Gurgel de Faria levando em conta óbices processuais, embora o julgamento tenha trazido consigo uma carga consequencialista enorme. Os advogados que sustentaram na tribuna anunciaram grande impacto econômico e social.
Base de cálculo
Segundo a Avon, o critério do preço do catálogo é incorreto porque os revendedores autônomos não são obrigados a comercializar os produtos pelo preço sugerido, sendo muito comuns os descontos.
Relator, o ministro Gurgel de Faria destacou que a Lei Complementar 87/1996 previu três formas alternativas de fixação da base de cálculo do ICMS devido em substituição tributária.
São elas: o resultado da soma dos valores da operação anterior, dos encargos e da margem de valor agregado; o valor tabelado por órgão de estado; e o preço final sugerido pelo fabricante ou importador — como, no caso, o preço do catálogo da Avon.
“Não se observa uma hierarquia entre as regras de fixação da base de cálculo, deixando-se ao Estado tributante a escolher entre as regras disponíveis aquela que lhe convier”, disse o relator. Com isso, o estado do Rio Grande do Sul pôde definir, através de legislação própria.
A análise dessas normas foi feita pelas instâncias ordinárias e configura interpretação de lei local, o que não pode ser feita pelas instâncias superiores.
Se a lei federal não estabeleceu hierarquia na forma de cálculo do imposto e primeiro e segundo grau interpretaram as normas locais, o STJ nada pode fazer quanto ao fato de o estado ter escolhido como critério o preço do catálogo.
“Assim, eventual violação de lei federal seria reflexa, e não direta, porque, para o deslinde da controvérsia, seria imprescindível a interpretação da legislação estadual mencionada no acórdão, descabendo, portanto, o exame da questão em sede de recurso especial”, concluiu o ministro Gurgel de Faria.
Voto vencido
Ficou vencido o ministro Napoleão Nunes Maia, que defendeu a superação dos óbices para a efetiva análise do mérito da questão. Segundo ele, o tema deve ser julgado com base na conveniência política, jurídica, social e econômica.
“Quando qualquer um dos cinco elementos da substituição tributária utilizados para a base de cálculo ficam à mercê de alguma decisão estatal, inevitavelmente se estabelece uma situação complicada”, opinou.
“E é difícil definir a base de cálculo desse tributo porque, no caso, está havendo uma interferência ou uma interveniência unilateral do próprio poder tributante. Seria irrazoável esperar que tal poder pudesse ser moderado, ou mesmo parcimonioso, no estabelecimento dessas bases de cálculo”, disse.
Impacto econômico
Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Venda Direta, que atuou como amicus curiae (amiga da corte) no processo, o resultado tem grande impacto em setor relevante da economia brasileira: são mais de 4 milhões de pessoas físicas que atuam com venda direta e movimentam valor estimado em R$ 45 bilhões, correspondente a 8% do Produto Interno Bruto brasileiro.
Esse mercado pode ser profundamente afetado porque se a base de cálculo para o imposto em substituição não observar percentual praticado na realidade, segundo a associação, o imposto não tem como ser recuperado.
Assim, o que ocorre é aumento da carga tributária, que deve ser repassada no preço, o que torna o setor menos competitivo, devido a canais de venda que operam com produtos similares – supermercados, farmácias, lojas e grandes redes varejistas.
Fonte: Conjur