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15/05/2020

STF nega liberação de depósito judicial em razão de pandemia

15/05/2020

Para ministro Luiz Fux, interferência poderia prejudicar orçamento da União

O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou pedido de um contribuinte para substituir por seguro garantia os depósitos em dinheiro de um processo ajuizado para discutir a cobrança de tributos. Ele afirma, na decisão, que esses valores ficam disponíveis na Conta Única do Tesouro Nacional desde o primeiro depósito, como prevê a Lei nº 9.703/98, e que são considerados parte do orçamento da União.

Interferir nesses recursos, portanto, poderia causar prejuízos ao orçamento federal que está sendo utilizado para o enfrentamento da pandemia da covid-19. “O cotejo entre o interesse público e o privado sinaliza para que o perigo de dano esteja mais associado aos interesses da sociedade do que do particular”, diz Fux.

Estão em jogo R$ 167,5 bilhões, segundo dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Esse dinheiro está distribuído em cerca de oito mil processos com depósitos no país.

A decisão do ministro Luiz Fux é a primeira que se tem notícias no STF durante a crise gerada pelo coronavírus. Antes da pandemia, pedidos de clientes para levantar os depósitos eram vistos pelos advogados como uma “missão impossível”. Há jurisprudência que beneficia a Fazenda Nacional.

Com a crise, porém, as empresas passaram a enxergar esses depósitos como uma possibilidade de reforçar o caixa e os pedidos ao Judiciário passaram a ser frequentes.

Há contribuintes que conseguiram decisões de primeira e segunda instâncias. Mas eles não são maioria. Segundo levantamento da PGFN, a cada cinco decisões, em média, só uma favorece as empresas nos Tribunais Regionais Federais (TRF).

Além disso, os posicionamentos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) também têm sido contrários. Pelo menos três decisões foram proferidas nesse sentido durante o período de pandemia, duas delas pelo ministro Campbell Marques (Resp nº 1674821 e TP 2649) e uma pela ministra Assusete Magalhães (Resp 1717330).

No caso julgado por Fux, no STF, o pedido para trocar o depósito por seguro garantia foi feito pelo Banco Volkswagen, que atua com operações de crédito e financiamento de veículos (ARE 1.239.911). O banco argumentou que “vem sofrendo enorme desafio em termos de caixa e liquidez” em razão do aumento de inadimplência dos seus clientes e altíssima demanda por renegociações com vistas a postergar o vencimento das parcelas.

Justificou ainda que “enfrenta também uma demanda para prover liquidez adicional à rede produtiva que cerca a cadeia automotiva, por exemplo, a disponibilização de capital de giro aos concessionários de veículos que vem enfrentando dificuldade por estarem obrigados a permanecer com as portas fechadas”.

“A falta de liquidez neste momento pode ocasionar verdadeiro processo de encerramento de atividades em cadeia e fechamento de milhares de postos de trabalho”, informou no pedido que foi feito ao ministro.

O Banco Volkswagen tentava a liberação de valores depositados judicialmente em processo que discute um aumento nos pagamento de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A Lei nº 11.727, de 2008, elevou de 9% para 15% a alíquota paga pelas empresas de seguros privados, de capitalização e das instituições financeiras associadas às federações afiliadas da Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif).

O ministro Luiz Fux, ao julgar o pedido de liberação dos depósitos, também levou em conta a matéria de fundo. “Em nenhum momento, em todo o curso da demanda, o Banco Volkswagen obteve provimento favorável do pedido de mérito”, afirma na decisão. Segundo o ministro, os pedidos formulados pelo banco na ação foram julgados improcedentes pela Justiça Federal e essa decisão foi confirmada pelo TRF da 3ª Região, que tem sede em São Paulo. “Ou seja, a probabilidade do direito reclamado, ao menos nesse momento, ombreia as pretensões do Fisco, e não do contribuinte”, frisa Fux.

O processo movido pelo Banco Volkswagen, acrescenta, “está diretamente relacionado ao destino a ser dado à ADI 4.101”, de sua relatoria, “que brevemente estará liberada para pauta”. A ação direta de inconstitucionalidade mencionada pelo ministro foi apresentada pela Consif contra os artigos 17 e 41 da Lei nº 11.727.

Especialista na área entende que a decisão do ministro Fux, apesar de ruim para os contribuintes, não encerra a discussão sobre a troca dos depósitos por seguro garantia.

O advogado acredita que os contribuintes têm chances nos casos em que fica demonstrada a situação de dificuldade financeira. “Não dá para dizer apenas que está sendo afetado pela pandemia. Tem que mostrar com documentos contábeis o efeito da pandemia nas suas contas. Tem que demonstrar a necessidade efetiva do desbloqueio daquele depósito.”

Para outro advogado, ainda é cedo para se falar em consolidação de jurisprudência, já que os demais ministros ainda não se manifestaram. “Na visão dos contribuintes, tempos difíceis exigem medidas extremas”, ele pondera. “Não se pode lidar com a crise humanitária e econômica sem precedentes que assola o país usando a jurisprudência firmada dentro da normalidade.”

Ele considera a situação das empresas como “muito grave” e diz entender que “isso deveria ser suficiente para sensibilizar os juízes da necessidade de se autorizar a substituição que, vale dizer, é dotada de praticamente a mesma liquidez”.

Os representantes do Banco Volkswagen foram procurados pelo Valor para comentar a decisão do ministro Luiz Fux, mas responderam que a empresa não se manifestaria.

Fonte: Valor Econômico

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