12/01/2018
Entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) já estudam questionar na Justiça o bloqueio de bens de devedores pela Fazenda Nacional sem autorização judicial. A medida está prevista na Lei nº 13.606, publicada nesta semana, e dá poderes ao órgão para tornar indisponíveis imóveis e veículos, por exemplo, de contribuintes com débitos tributários no âmbito federal.
A Comissão de direito tributário da OAB já sugeriu ao presidente do órgão, Claudio Lamachia, a proposição de uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF). A área jurídica da Fiesp desde quarta avalia argumentos jurídicos contra a norma.
“Trata-se de uma medida perigosa, pois a velocidade de um desbloqueio de bens nem sempre é rápida quanto a de um bloqueio”, afirma o diretor jurídico da Fiesp Hélcio Honda. Pode, inclusive, dificultar a operacionalização econômica das empresas, que não poderiam dispor dos bens para outras operações, segundo Honda. Ele afirma que a entidade é a favor de uma execução fiscal rápida – ação de cobrança de tributos -, mas com a participação do Judiciário e dentro do devido processo legal.
Inúmeros princípios constitucionais e legais são listados por juristas como argumentos que poderiam ser utilizados contra a norma. O presidente da comissão de direito tributário da OAB, Breno Dias, por exemplo, afirma que o bloqueio sem decisão judicial contraria direitos assegurados pela Constituição como o da propriedade, do devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa.
Segundo ele, o STF legitimou o protesto de Certidão de Dívida Ativa, mas trata-se de uma situação diferente do bloqueio de bens. A professora de direito tributário da PUC-SP, Maria Leonor Leite Vieira, acrescenta que o julgamento do Supremo não se abriu para essa possibilidade. “A lei transmite à PGFN exercício que o órgão não detém e que pertence ao juiz”, diz. A professora também afirma que a Lei de Execução Fiscal (LEF) e o Código Tributário Nacional (CTN) continuam em vigor e mantêm os ritos próprios para cobrança de tributos pela União.
“O Fisco está pulando etapas e ferindo o devido processo legal, cria uma fase que antecede a cobrança judicial”, diz advogado especialista. Segundo ele, a medida está dentro do que o Fisco considera medidas coercitivas.
O vice-presidente executivo da Confederação Nacional de Serviços (CNS), Luigi Nese, também critica os mecanismos de bloqueio. No caso do Bacenjud, segundo Nese, em que há penhora de valores em conta bancária, em algumas situações o valor bloqueado supera o débito, prejudicando as atividades empresariais. A confederação estudará a questão para decidir se questionará os dispositivos da lei no STF. “Não é vontade de não pagar imposto, mas tem que ser feito de forma que a empresa possa se defender se houver cobrança indevida”, afirma.
Para o diretor jurídico da Fiesp, é necessário uma discussão ampla de um modelo legal que torne a cobrança fiscal mais ágil e não uma norma colocada em uma lei que não tem qualquer relação com a execução fiscal – norma que trata do parcelamento de débitos do Funrual. “A medida não cria agilidade, apenas a trava de bens, o que já pode ser feito pela procuradoria por cautelares fiscais e arrolamento de bens, por exemplo”.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional defende que a novidade foi proposta a partir de uma recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) em decisão que determinou à União a apresentação de um plano de ação para melhorar a recuperação dos débitos inscritos em Dívida Ativa da União. Também segue mecanismos semelhantes de países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Para a PGFN, não há inconstitucionalidade no bloqueio. Segundo Daniel de Saboia Xavier, coordenador-geral de Estratégias de Recuperação de Créditos da PGFN, a indisponibilidade de bens não seria medida autorizada apenas ao Judiciário, como no caso da quebra de sigilo telefônico. Além disso, não existiria ofensa ao direito de propriedade, pois o objetivo do bloqueio é garantir que o devedor não aliene o patrimônio a terceiros, o que frustraria a cobrança durante a execução judicial.
“Caberá ao poder judiciário expropriar o patrimônio do devedor, após a conversão da indisponibilidade em penhora, ou determinar o levantamento do bloqueio caso o devedor apresente outros bens em garantia”, afirma.
Fonte: Valor Econômico.